sexta-feira, 4 de novembro de 2011

QUATRO DE AGOSTO É O DIA DO SUL?

Celso Deucher*

Faz bom tempo que venho me questionando sobre uma data unificadora para nossa causa. Em especial, sempre procurei um dia em que pudéssemos os três estados em uníssono comemorar a data da nossa pátria. Este dia existe de direito em cada estado, mas ele não existe de fato para todo o Sul. Diante deste impasse, pretendo nos próximos parágrafos, fundamentar a data, 4 de agosto, que defendo como cidadão Sulista, seja o nosso dia, o “Dia do Sul”.

Mas antes, quero apresentar uma questão anterior que também me chama muita a atenção e que no princípio, pensei seriamente que seria o nosso dia do Sul. Alguns defendiam que a data deveria ser comemorado na data de nascimento do nosso grande herói, o primeiro deles, Sepé Tiarajú. Há quem pense que o nascimento de um país “casaria” muito bem com o nascimento de um herói. No caso de Sepé, esta data não existe, segundo as pesquisas que realizei com base na historiografia sobre este mártir da nossa autodeterminação. O que existe é a data da sua morte, ocorrida 7 de fevereiro de 1756.

Poderia ser esta uma boa data, pois foi na guerra em que Sepé foi morto pelo Brasil que foi gravada no umbral da história o primeiro grito de “Esta Terra Tem Dono”. Com esta frase e o exemplo de nosso herói, foi que deu inicio lá no longínquo século XVIII, a nossa epopéia libertadora mantida com muito idealismo, suor e sangue até os dias atuais. A história comprova que Sepé Tiarajú abraçou uma causa que de muito já vinha sendo abraçada por Guairacá no Paraná e em grande parte de Santa Catarina, onde já temos provas concretas que haviam missões jesuíticas, em especial no litoral, no norte e no oeste do estado. A grande “Marcha dos Catecúmenos” realizada Sul abaixo até os Sete Povos das Missões reunificaria este verdadeiro e primeiro “Povo Sulista” (isso mesmo, em maiúscula). Nascia nos Sete Povos, mesclados e cimentados no trabalho conjunto, no amor as artes e na valorização da terra, a célula mãe do Povo Sulista. A tentativa de matar esta primeira célula separatista Sulista deu-nos o martírio de Sepé Tiarajú e através do seu exemplo, ecoa até hoje entre nós o sentimento de que “esta terra tem dono”.

Mas a personalidade de Sepé, em que pese ser nosso pioneiro guerreiro pela liberdade, não é tão conhecida nos três estados. Este fato me foi alertado por alguns amigos historiadores que ao longo do tempo venho consultado, inclusive alguns riograndenses, estado onde Tiarajú é mais conhecido. Ao final das conversas, no entanto, retornava minha primeira pergunta: que personalidade e que data seria a mais apropriada para unificar nosso povo? Cheguei a pensar em criar uma data através de um fato ainda por vir... Mas desisti no meio do caminho. Não suporto nem imaginar colocar a vida de um semelhante em perigo.

No entanto, nestas consultas a historiadores e companheiros de luta nos três estados, invariavelmente um nome sempre surgia nestas conversas e aos poucos fui me convencendo que era preciso me debruçar sobre ele para aprofundar a compreensão e buscar os elementos certos que viessem a nos dar a tão clamada “unidade na nossa diversidade”.

Me convenci ao longo dos anos que este nome chama-se ANITA GARIBALDI. O simples declinar do seu nome, acende na alma Sulista o fogo ardente da liberdade. Anita tem o dom de fazer aflorar o orgulho da gente Sulista, pois todos conhecem seus feitos, sua luta, sua garra e sua personalidade guerrilheira. Afinal, nossa terra pariu uma heroína reconhecida não apenas aqui, mas nos “dois mundos”.

Ela é o cordão umbilical que liga os três Estados Meridionais, pois é filha de paranaense (Bento Ribeiro da Silva, natural de São José dos Pinhais, Paraná) e de mãe catarinense (Maria Antônia de Jesus Antunes, natural de Lages, Santa Catarina) e que além de nascer no Sul (Laguna, SC, cidade cujos filhos colonizaram do Rio Grande do Sul), lutou pela República Catarinense e pela República Farroupilha. No Rio Grande além de residir por bom tempo, teve seu primeiro filho, Menotti Garibaldi, nascido no atual município de Mostardas. Todas estas ligações a tornam, por excelência, o símbolo maior de unidade Sulista. Além disso tudo temos fortes indícios históricos levantados pelo historiador Carlos Zatti, do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná, que diversos guerrilheiros daquele estado também se envolveram ao lado dos Farrapos no decênio heróico na esperança, já na época, de livrar-se da tirania brasileira.

A participação ativa de Anita Garibaldi na principal conflagração separatista da nossa era a fez não apenas uma mulher Sulista, mas uma heroína que ganhou o mundo por seu forte exemplo de coragem, sacrifício, luta e perseverança. Anita é por excelência, a guerrilheira que existe dentro de cada um de nós homens e mulheres livres do Sul. Ela é a nossa inspiração e não é por acaso que o Movimento O Sul é o Meu País foi fundado em Laguna, terra que pariu e fez germinar Anita.

Ana Maria de Jesus Ribeiro, a nossa Anita Garibaldi, é descendente do bravo povo açoriano (e há indícios e até declarações por escrito que indicam que ela possuía também descendência africana), que povoou todo o litoral Sulista. Anita nasceu em Laguna no dia 30 de agosto de 1821, filha de um tropeiro e de uma empregada doméstica. Era chamada carinhosamente de Aninha e se tornou a gigante Anita após conhecer e se apaixonar pelo amor da sua vida, o italiano Giuseppe Garibaldi, conhecido no mundo todo como o guerrilheiro da liberdade, e em especial aqui para no Sul, grande comandante das forças navais da República Riograndense e da República Catarinense.

Anita teve seus atos de bravura elogiados inclusive pelos inimigos mais ferozes da América e da Europa, mas no Brasil nunca foi reconhecida, sendo na verdade por demais discriminada. A prova maior é que não poucas vezes foi chamada de “prostituta” da tribuna do plenário do Congresso Nacional brasileiro. Perseguida por todas as forças de terra e mar do Brasil, ao partir para a Europa, tentaram de tudo para acabar com sua honra, espalhando os mais vis boatos sobre sua separação do primeiro marido, um beberrão que nunca lhe devotou amor e ainda a abandonou a própria sorte para lutar no exército brasileiro (inimigo de Anita e de sua família).

Mas, seus feitos e seus exemplos de bravura em prol da liberdade conseguiram transpor a cortina de impropérios lançada pelo Brasil contra esta humilde cidadã do Sul. Não podendo vencê-la em vida, recentemente um presidente brasileiro resolveu vencê-la “post-mortem”, lhe dando o título de “heroína brasileira”. Com o perdão da expressão, mas certamente que Anita cuspiria na cara de quem teve tão estúpida idéia. Jamais Anita lutou pelo Brasil. Muito pelo contrário, era seu principal inimigo. Como então ser heroína do seu principal inimigo? Por causa da capenga teoria de historiadores de “pena alugada” que julgam ser a revolução Sulista os atos preparatórios para a chegada da República no Brasil? Nada mais estúpido e cretino vindo de gente desta laia que só escreve a “história oficial” a peso de ouro. Anita jamais lutou pelo Brasil. Sua luta foi por esta terra, o Sul, e ponto final. É hora de darmos um basta nesta gonorréia republicana que criaram para “construir” a chamada pré-história da república no Brasil.

Partindo da América Portuguesa Anita Garibaldi lutou ainda no Uruguai e mais tarde seguiu para a Europa, onde na Itália, ombro a ombro com seu marido Giuseppe, participou ativamente da revolução italiana, unificando os diversos reinos existentes naquele país. Morreu lutando pelo que acreditava e não temos a menor dúvida de que ela foi uma das precursoras na defesa do Direito de Autodeterminação dos Povos.

Após uma verdadeira epopéia guerrilheira na Itália, Anita veio a falecer em Mandriole “era, 19h45min de sábado, dia 4 de agosto de 1849”.

Deixava esta vida para que com todas as honras da heroína que foi, entrar para a história. Estava morta em terras distantes uma das maiores mulheres que a humanidade já teve. Uma paranaense, uma catarinense, uma riograndense, enfim, uma Sulista de corpo, alma e sentimento.

Mas quem pensa que a sua morte foi o fim está muito enganado. Anita depois de morta continuou estimulando muitas revoluções. Por continuar guerrilheira, já foi enterrada sete (7) vezes e no seu último enterro, uma multidão de mais de um milhão de pessoas seguiram o seu féretro. Em um livro que pretendo lançar ano que vem, intitulado “O oitavo enterro de Anita”, nos juntamos na luta do movimento pelo repatriamento dos restos mortais de Anita Garibaldi para o Sul. Advogo que a heroína seja sepultada em sua terra natal, Laguna SC, nosso “Altar da Liberdade”, por tudo que esta cidade e a heroína representam para a pátria Sulista. Será pois, o seu oitavo e definitivo enterro voltando a terra que lhe deu a luz.

Convido aos que ainda não conhecem a história desta nossa grande heroína, para que pesquisem mais sobre ela. Há mais de 10 mil livros escritos sobre Anita e na internet, temos muita coisa publicada. Recomendo, no entanto, pela fidelidade aos fatos, a leitura do livro “Anita: Guerreira das Repúblicas”, escrito pelo fundador do Movimento O Sul é o Meu País, Adílcio Cadorin, disponível gratuitamente no seguinte link http://www.paginadogaucho.com.br/bibli/anita.htm e o livro impresso, certamente ainda disponível em sebos da América Portuguesa. Esta obra retrata com riqueza de detalhes a vida de Anita Garibaldi, seus feitos e o seu pensamento, muitas vezes expressado através de cartas aos parentes no Sul.

Diante de tudo isso, me resta agora apresentar para a elevada consideração dos meus compatriotas de luta no Movimento O Sul é o Meu País a proposição de que a data da morte de nossa maior heroína, dia 4 de agosto, seja pois, o nosso DIA DO SUL. Não há, salvo melhor juízo, outra data mais apropriada e mais significativa para os três estados. Assim, além de revigorarmos nossa luta todos os anos nesta data, ainda poderemos prestar nossas homenagens a esta grande Sulista, que levou a nossa futura pátria para o mundo.

Todos os anos deveremos, se esta for a data escolhida, preparar um grande evento para expressar nosso sentimento pátrio. No DIA DO SUL, por toda a terra do Povo Sulista, vamos hastear nossa bandeira, orgulhosos do nosso passado, comprometidos com a luta no presente e esperançosos de que o mais breve possível possamos comemorar nosso futuro em uma pátria livre, independente, soberana e solidária com os demais povos do mundo. Anita é o cimento que faltava para nos unir.

VIVA O SUL LIVRE!!!

*O autor é jornalista, professor, secretário geral do Gesul e presidente do Movimento O Sul é o Meu País. Email: presidente@meusul.net

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